terça-feira, 13 de julho de 2010

Bola no Chão: Mundial de A a Z (Parte I)

DE ANDRÉS INIESTA À MANNSCHAFT

A: Andrés Iniesta.
Sóbrio, discreto e empenhado. Iniesta tem vinte seis anos, parece ter mais, e fez toda a sua carreira no Barcelona. Cresceu, formou-se e ganhou prestígio em Camp Nou. Sem levantar ondas, sem fazer birras, apenas cumprindo o seu trabalho com dedicação. É, juntamente com Xavi, um dos principais responsáveis pelo funcionamento do carrossel triunfante e envolvente do Barça. Também da selecção espanhola. Sempre em crescendo, no Mundial 2010, atingiu o ponto máximo na final. Faltavam quatro minutos para o final do prolongamento quando recebeu a bola de Fàbregas e, com classe e frieza, rematou certeiro. Imortalizou-se. E Espanha ganhou.

B: Brasil.
Uma busca desenfreada pelo hexacampeonato mundial. Depois do fracasso na Ásia, somente chegando aos quartos-de-final, a selecção brasileira, com Dunga, recuperou o seu poder, as vitórias internacionais e lançou-se para a linha da frente na conquista do Mundial da África do Sul. Jogando sem encantar, adoptando um estilo mais europeu, com maior pragmatismo e cautela em detrimento da pura genialidade brasileira, o escrete falhou. Nunca mostrou realmente o seu valor, limitou-se a cumprir os mínimos. Passou comodamente a fase de grupos e eliminou o Chile antes de encontrar a Holanda. Frente à Laranja, o Brasil não teve forças. E caiu com culpa própria.

C: Cabazada.
Ganhar por sete golos é um resultado que já não se usa. Fazê-lo num Campeonato do Mundo, na maior prova de selecções, é ainda mais inusitado. Portugal conseguiu-o: no seu segundo jogo, frente à Coreia do Norte, a equipa portuguesa mostrou gula, enorme vontade de ser feliz e eficácia, derretendo com sete golos à frágil e dócil selecção norte-coreana. O resultado, pesado mas identificador das desigualdades existentes entre as duas equipas, entrou para as galerias e estabeleceu a vitória mais avolumada do Mundial da África do Sul. Em nenhum outro jogo se marcaram tantos golos. E, dificilmente, a marca será superada nos tempos mais próximos.

D: Diego Armando Maradona.
Dezasseis anos depois. A última vez que El Pibe aparecera num Mundial fora nos Estados Unidos da América. Na África do Sul, voltou. Sem os calções a baloiçar, sem o fio ao pescoço, sem a mesma condição física. Regressou na pele de treinador: fato, barba negra e branca, um relógio em cada pulso e uma pulseira com uma medalha enrolada na mão. Com a mesma alma, a mesma vontade e a mesma fé de antes. Maradona foi um líder, um comandante, uniu o seu grupo e colocou-o no relvado à sua medida, jogando por prazer, voltando à essência do futebol. Só que El Pibe nunca será um estratega, um táctico. Nunca será treinador. A Argentina sentiu-o.

E: Eclipse.
Ronaldo, Messi, Rooney e Kaká. Quatro jogadores majestosos, a nata do futebol mundial, que estiveram em eclipse na África do Sul. De Ronaldo e Messi, principalmente, espera-se tudo: que defendam, que corram, que driblem, que assistam e que marquem. Por Portugal e pela Argentina, as suas selecções, pouco fizeram. Messi ainda deu um ar da sua graça nos primeiros jogos, Ronaldo conseguiu marcar um golo feliz. É muito pouco. Também de Rooney e de Kaká, estrelas da Inglaterra e do Brasil, pouco se viu. As duas selecções, favoritas, ficaram longe do que poderiam ter feito. Fernando Torres, avançado espanhol, é outro exemplo. Só que com final feliz.

F: Forlán.
Com as principais estrelas em eclipse, pouco demonstrando no Mundial, emergiram outras figuras. Diego Forlán, avançado uruguaio, foi a principal. E, por isso, reconhecido como o melhor jogador deste campeonato do Mundo. Numa selecção surpreendente, com um colectivo fortíssimo e uma entrega total ao jogo, houve lugar para que Forlán, a principal estrela do futebol do Uruguai, se destacasse, num belo seguimento da temporada que realizara no Atlético de Madrid. Esteve nos sete jogos da celeste, marcou cinco golos e nunca se escondeu quando foi necessário. Sobretudo a Diego Forlán, tal como a Luis Suárez, os uruguaios estarão eternamente gratos.

G: Gyan.
O Gana, repetindo a proeza de Camarões e Senegal, em 1990 e 2002, chegou aos oitavos-de-final do Mundial. Esse era o ponto máximo para as selecções africanas: nunca nenhuma havia passado daí. O decisivo jogo com o Uruguai, nos quartos-de-final, terminou empatado. Houve prolongamento. No último minuto, Asamoah Gyan, maior estrela ganesa que demonstrou ter capacidade para chegar mais alto na sua carreira, dispôs de uma grande penalidade. Teve fé, confiança, carregou o peso de um continente esperançado no sucesso do seu único representante. A bola esbarrou na trave. Gyan desesperou. O Uruguai, depois, ganhou na lotaria.

H: Holanda.
Esta Holanda não é a Laranja Mecânica de Johan Cruyff. Nem conta com estrelas como Ruud Gullit ou Van Basten que marcaram presença no título europeu de oitenta e oito. A selecção holandesa, comandada por Lambertus Van Marwijk, quase desconhecido antes do início do Mundial, reapareceu bem, suportada por Wesley Sneijder e Arjen Robben, mostrando valor e futebol ofensivo. Superou as expectativas, galgou terreno, deixou o papão Brasil pelo caminho e chegou à final com mérito. Perdeu-a. Como perdera as outras duas, em 1974 e 1978, em que participara. Pela primeira vez neste Mundial, seis jogos passados, foi derrotada. Fatalmente.

I: Irreverência.
Tem ambição, coragem, confiança nas próprias capacidades e muita disponibilidade para ajudar. Mesmo quando as coisas não correm bem, quando o tempo corre e nada se altera, quando o resultado não é o desejado. Fábio Coentrão foi uma das figuras do campeonato português. De promessa sempre adiada, a caminho do enésimo empréstimo, saiu um lateral-esquerdo de enorme valia. Na sua simplicidade, sem olhar a nomes, Fábio deu continuidade ao que tinha feito, impressionou os maiores clubes mundiais e conseguiu ser um elemento positivo na selecção portuguesa. Não se atormentando com os adversários, confiando em si, ganhou protagonismo.

J: Jabulani.
Redonda, colorida e bonita. A Jabulani, à primeira vista, é igual a tantas outras bolas. Goste-se ou não da estética. No mais importante parece servir para o mesmo que as suas antecessoras: para fintar, para fazer toques em habilidade, para passar e para marcar. Só que a Jabulani logo levantou problemas. Os guarda-redes, sobretudo, sentiram que ali estava um perigoso inimigo. Mais leve do que é habitual, com trajectórias difíceis e traiçoeiras, a Jabulani não agradou a ninguém. Não houve quem faltasse a apontar o dedo à bola, carimbada como matreira, para justificar erros. Fossem eles falhas dos guarda-redes ou pontapés na atmosfera...

K: Klose.
Miroslav Klose marcou dois golos frente à Argentina. Aproveitou os passes bem medidos, depois de um trabalho colectivo, para concluir com toda a sua classe. O último deles foi o seu décimo quarto em Mundiais: marcou cinco na Ásia e na Alemanha, na África do Sul chegou aos quatro. A Alemanha perdeu, frente à Espanha, a oportunidade de voltar a conquistar um título mundial, mas Klose, avançado do Bayern de Munique, ainda teria uma chance: o jogo, com o Uruguai, na atribuição do último lugar do pódio. Ou não: Klose lesionou-se, falhou a última partida alemã e colocou um sorriso em Ronaldo, o Fenómeno, que mantém o seu record de golos - quinze.

L: Larissa Riquelme.
Páre, escute e olhe. Larissa Riquelme está na bancada. O Paraguai, a selecção do seu país, joga no relvado. Larissa distingue-se de todos. E faz por isso: chama as atenções, atrai e fixa-as. Pode ser por inventar um novo lugar para guardar o telemóvel. Não é uma adepta qualquer. Pelo seu país é capaz de tudo. Até despir-se. Se a Espanha fosse batida, nos oitavos-de-final, os paraguaios teriam esse prémio. A promessa foi feita, o Paraguai perdeu mas Larissa Riquelme, para recompensar a caminhada da selecção de Marcelo Bielsa, mantém as ideias. A noiva do Mundial, uma animação constante nas bancadas, saltou para a ribalta. Vinda da bancada.

M: Mannschaft.
Equipa no seu real sentido. Olhos colocados na baliza contrária, ocupação dos espaços, pressão para não permitir aos adversários recuperarem e muita velocidade para desferir os golpes necessários. A Alemanha de Joachim Löw foi quem melhor jogou na África do Sul. As goleadas impostas à Inglaterra e à Argentina, nos dois primeiros jogos a eliminar, devem ser emolduradas e mostradas a quem pretende sucesso. Especialmente na forma de interpretar os momentos do jogo, sendo uma equipa camaleónica, para ser letal nas saídas rápidas para ataque. Um míssil de Puyol, nas meias-finais, travou o sonho alemão. O sonho de Müller, Özil ou Schweinsteiger.

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