quarta-feira, 14 de julho de 2010

Bola no Chão: Mundial de A a Z (2ª Parte)

DAS NOVAS TECNOLOGIAS AO NÚMERO ZERO

N: Novas Tecnologias.
A introdução das novas tecnologias no futebol é um tema extenso, polémico e repetido. O argumento mais utilizado para as negar prende-se com a paixão: com a sua utilização, tornando o futebol menos emotivo e mais exacto, o jogo poderá sentir duras mudanças. O Mundial da África do Sul foi um verdadeiro teste à resistência da FIFA. Um remate de Frank Lampard, que daria o empate à Inglaterra no jogo com a Alemanha, que Jorge Larrionda não validou e um tento de Carlitos Tévez em claro fora-de-jogo foram, num só dia, dois golpes profundos no conservadorismo de quem tutela o futebol. A mentalidade está, agora, a mudar. Sim ou não?

O: Olegário Benquerença.
Foi o oitavo árbitro português a marcar presença num Campeonato do Mundo. Dois era o máximo de jogos dirigidos. Olegário ultrapassou essa marca: esteve em três encontros, dois da fase de grupos e outro dos quartos-de-final, assumindo cada vez mais um papel de relevo no principal rol de árbitros europeus. Sóbrio, discreto, sem encontrar complicações e também sem querer ser protagonista, Olegário Benquerença superou as expectativas e deixou, juntamente com José Cardinal e Bertino Miranda, a arbitragem portuguesa bem representada e com caminho aberto a uma nova convocatória. Esteve no jogo mais dramático do Mundial 2010: Uruguai-Gana.

P: Paul, o polvo.
Nasceu em Inglaterra e mora num aquário alemão. Não se sabe se gosta ou não de futebol. O que é certo é que ganhou um lugar no Mundial 2010. É um polvo como qualquer outro. Só com uma diferença: adivinha os resultados. Por viver na Alemanha, os responsáveis do aquário decidiram arriscar. Colocam-se duas caixas, uma com a bandeira alemã e outra com a bandeira do adversário, para que Paul decida. Nos seis jogos realizados pela Alemanha, incluindo a surpreendente derrota frente à Sérvia, na segunda jornada da fase de grupos, acertou. Fez mais duas previsões: a Alemanha seria terceira e a Espanha campeã. Mesmo em cheio, Paul!

Q: Quedas.
Com estrondo. Campeão e vice-campeão mundiais nunca haviam deixado um Mundial na fase de grupos. Aconteceu na África do Sul: Itália e França, os dois primeiros do último Campeonato do Mundo, caíram, estrondosamente, sem honra nem glória. E, além disso, sem somar qualquer vitória, em grupos teoricamente acessíveis. Os italianos pagaram pelo pragmatismo, pela procura do mínimo esforço e pela falta de alegria com que jogaram. Perderam pelo postura cínica que tantas vezes resultou. Na selecção francesa, numa caricatura daquilo que é a França, tudo correu mal. Birras com Raymond Domenech, greve aos treinos, ar carrancudo e profundo desalento.

R: Reconhecimento
Thomas Müller apareceu no Bayern de Munique, há duas temporadas, com Jürgen Klinsmann. Poderia ter sido um jovem, como tantos outros, a orgulhar-se de ser chamado à equipa principal. Não ficou por aí. Thomas tem talento, genialidade e muita ambição de triunfar. Louis Van Gaal tornou-o num indiscutível. Na selecção germânica, onde se destacou com Mesut Özil ou Manuel Neuer, o atacante de vinte anos foi um dos principais rostos da boa caminhada. Não deu para ganhar, sim, mas o terceiro lugar fica como consolação. Thomas Müller, número treze como Gerd, o Bombardeiro, ganhou o prémio para melhor jovem. Perfeito para coroar o seu brilharete.

S: Sul.
África do Sul recebeu o primeiro Campeonato do Mundo realizado em solo africano. Nos relvados, contudo, a equipa liderada por Carlos Alberto Parreira demonstrou muita ingenuidade e tornou-se no primeiro anfitrião a ficar-se pela fase de grupos - a vitória sobre a França, a terminar, foi um bálsamo. A América do Sul teve, durante o período inicial, um largo ascendente. Todas as selecções conseguiram o apuramento para os oitavos-de-final: Brasil e Argentina, favoritos, Uruguai e Paraguai, surpresas, e também Chile, a única equipa sul-americana apurada em segundo lugar, atrás da Espanha. No entanto, nas eliminatórias, a Europa impôs-se.

T: Tiki-taka.
Passa, repassa, toca, circula e gira. A bola não pára nunca. O objectivo é preservá-la, progredir e com isso ir empurrando o adversário para a sua área. O tiki-taka do Barcelona, naquele carrossel futebolístico que parece perfeito, foi a inspiração para Don Vicente del Bosque: dá resultados, é bonito, muitos dos artistas são os mesmos e, por isso, só há que o aproveitar e explorar. Em tiki-taka, passe para aqui e passe para ali, a Espanha venceu o Mundial. Mesmo não sendo deslumbrante. Massacrou em posse de bola, encostou o rival às cordas, faltou-lhe apenas poder de fogo. Apesar dos cinco golos de David Villa, foi o campeão que menos marcou.

U: Uruguai.
Raça, suor, sacríficio, dentes cerrados e muita luta. Assim se construiu o sucesso uruguaio. O Uruguai apresentou uma equipa forte, liderada por Óscar Tabárez, onde houve espaço para estrelas como Forlán ou Suárez emergirem. Ultrapassou bem a fase de grupos e suou para derrotar a Coreia do Sul, nos oitavos-de-final, antes de dar largas ao sonho. O seu último título, o segundo que conquistaram, foi há já sessenta anos. E há quarenta que não estão numa final. Ainda não foi desta mas deixaram uma bela imagem. Difíceis de quebrar, com alma e coração, ganharam um lugar honroso e foram a selecção sul-americana que chegou mais longe.

V: Vuvuzelas.
Antes do Mundial poucos saberiam o que era. A moda pegou: em cada canto, num estádio sul-africano ou numa avenida portuguesa, a vuvuzela fez parte da vida dos adeptos. Tem um som característico, instrumento adorado pelos africanos e uma perturbação enorme para jogadores, treinadores e, até, adeptos. É profundamente irritante. Mas, ao mesmo tempo, sinal de festa. Repudiadas por quase todos, acusadas de desconcentrações, as vuvuzelas marcaram o Campeonato do Mundo. Do princípio ao fim, do primeiro ao último minuto, lá estiveram presentes. Os árbitros, imunes ao som, foram os únicos que não se queixaram. Terá a praga alastrado?

W: Webb.
Howard Melton Webb, natural de Yorkshire, foi o escolhido para dirigir a final do Mundial da África do Sul. O último árbitro inglês a estar presente no mais decisivo jogo de um Campeonato do Mundo fora, em 1974, Jack Taylor. Howard Webb estava, por essa altura, a uma semana de completar dois anos de idade. Trinta e seis anos depois, também com a Holanda pelo meio, Webb quebrou esse interregno e atingiu o pico da sua carreira: antes do Mundial, meses antes, estivera na final da Liga dos Campeões. Tornou-se no quarto inglês a arbitrar a final de um Mundial. Contudo, apesar de ser actualmente o número um, o jogo não lhe correu de feição.

X: Xavi
Xavi Hernández não é um jogador de loucuras. Não pega na bola, colada ao pé, arranca em velocidade, finta todos os adversários que lhe surgem pela frente e marca um golaço. Xavi é como Iniesta: pensador, cerebral, encarregue de fazer girar a equipa. Sabe perfeitamente as suas funções, conhece-se como ninguém e joga com inteligência. O que tem que fazer, faz. E bem. Guarda a bola como ninguém, foge dos adversários, passa com visão periférica e aparece no momento certo para voltar a receber a bola. Trabalha, funciona como equilíbrio e constrói para que outros finalizem. O futebol é um trabalho de equipa. Xavi é quem faz o carrossel girar.

Y: Yes, they can.
A frase original, com we em vez de they, ficou popularizada na campanha de Barack Obama rumo à presidência dos Estados Unidos da América. Os norte-americanos procuravam um novo líder, com outras ideias e capaz de quebrar com a tradição imposta. Na África do Sul, um país que pareceu impreparado para receber um evento da envergadura de um Mundial, houve suspeição, desconfianças e medo. Os primeiros sinais que chegaram, com insegurança e algum amadorismo, não foram positivos. Mas à medida que o Mundial foi decorrendo, África do Sul fez por merecer ter as estrelas junto de si. Com paixão, fervor e entusiasmo, deu o seu melhor.

Z: Zero.
Portugal e Uruguai foram as únicas duas equipas que conseguiram terminar a fase de grupos sem golos sofridos. Do mérito português, todo ele assente numa defesa consistente e concentrada, destaca-se Eduardo. O guarda-redes do Sp.Braga, olhado com desconfiança antes do Mundial, emergiu, ganhou destaque e foi, a par de Fábio Coentrão, o melhor jogador da selecção portuguesa. Enérgico, incentivador e guerreiro, sobretudo com a Espanha, Eduardo afirmou-se como dono da baliza nacional. Sofreu apenas um golo, na eliminação, onde foi heróico e acabou destroçado. Zero foi também o número de pontos de Argélia e Coreia do Norte.

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